quarta-feira, 29 de julho de 2009

O papel de cada um na preservação do planeta

Veículos de comunicação em geral têm salientado com cada vez mais recorrência a importância de ações individuais no combate às diversas formas de poluição, ao mesmo tempo em que reverberam a adoção, por todos, de hábitos de vida sustentáveis. São reportagens do tipo "o futuro da natureza depende de você" que acabam por delegar ao indivíduo comum o poder (ou o dever) de salvar o planeta. Mas como as iniciativas individuais contribuem para a efetiva preservação do ambiente e qual o peso dessa contribuição em comparação à do setor industrial? Dar enfoque ao papel do indivíduo na preservação da natureza é o meio mais eficaz de a mídia cobrir a devastação ambiental?

Passarinhos e elefantes

As ações individuais são, sim, importantes. Um banho de 15 minutos consome, em média, 130 litros de água. Se uma pessoa que se banha duas vezes por dia reduzir o tempo no chuveiro para cinco minutos, economizará até 64 mil litros por ano. Acontece que o setor urbano (incluindo o uso doméstico) representa 10% do consumo de água no mundo. Na agricultura, práticas como irrigação exagerada – o agricultor irriga em excesso para diminuir risco de colheita insatisfatória – desperdiçam os recursos hídricos em escala muito maior do que deixar a torneira aberta ao escovar os dentes, por exemplo. Isso porque a agricultura, sozinha, responde por 70% da demanda mundial de água e, proporcionalmente, o desperdício dos agricultores é bem superior ao desperdício doméstico de milhares de pessoas.

Investimentos em melhoria do sistema de esgotos e construção de aterros sanitários, fiscalização e efetiva punição de empresas que descumpram medidas ambientais e aplicação de políticas públicas são alguns itens que não devem ser esquecidos, não apenas no 5 de junho,
Dia Mundial do Meio Ambuente, mas durante todo o ano. Ao se voltar apenas para um – o indivíduo comum, peça na qual converge todo o desprezo de órgãos públicos e privados por um desenvolvimento sustentável –, as matérias que focam ações cidadãs muitas vezes esquecem de efetuar uma contextualização mais abrangente dos fatos.

Participação mais impactante


Como é possível sustentar o discurso de que cada indivíduo deve fazer seu papel na preservação do ambiente quando:


1. O projeto de lei 1991-07, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos, prevendo estímulos fiscais à atividade de reciclagem e responsabilizando as empresas pelo lixo pós-consumo, está há 18 anos parado no Congresso Nacional;
2. Uma área de quase três vezes o Estado de São Paulo na Amazônia é ocupada por pastagens degradadas, com baixa ou nenhuma produção;
3. Avançar sobre a floresta é mais barato do que recuperar as áreas degradadas. Segundo avaliação do Ministério de Assuntos Estratégicos, enquanto a recuperação fica entre R$ 1.500 e R$ 3.000 por hectare, o valor de avançar em área virgem e desmatar custa R$ 300 a R$ 600 por hectare?

Na luta contra efeito estufa, aquecimento global e congêneres, o empenho de cada indivíduo é importante? Sim. Mas se deve sinalizar ao leitor que há alguns indivíduos cuja participação pode ser mais impactante. Indivíduos madeireiros e indivíduos fazendeiros, os quais, de acordo com pesquisa da Datafolha, são apontados pela população como os principais responsáveis pelo desmatamento da Amazônia. E indivíduos políticos, como o presidente Lula e sua base aliada, que usam obras do
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e a Petrobras, junto a poluidores como carvão e petróleo, para liberar cada vez mais gás carbônico pelas chamas da disputa eleitoral.


*Esse texto é uma adaptação do meu artigo de igual nome publicado no
Observatório da Imprensa em 28/7/2009. Leia o artigo completo.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

A razão

Todo ponto de vista é a vista de um ponto
Leoardo Boff

Muitos de vocês talvez tenham se perguntando o porquê de eu ter criado um blog cujo foco fosse choque de ideias.

Na verdade, este é um espaço de "resposta" a mim mesmo: por estar em uma fase de autoconhecimento, descobertas, novas acepções das coisas, da sociedade, do mundo, enfim; vejo que é importante debater certos temas de modo mais enérgico e/ou diferenciado.

Certo post pode ter um tom de desagravo, outro de exaltação ou ainda de reviravolta ideológica. De um modo ou de outro, o fato é que eu sempre recebo a chacoalhada.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Práticas corporais da tribo sero-Dahlam

Convivi cerca de um mês com um grupo cuja forma de lidar com o próprio corpo envolve elementos comumente tratados em separado: dor e satisfação. Os sero-Dahlam não são uma tribo de laços étnicos, mas de hábitos, a qual tem crescido por todo o mundo desde a segunda metade do século XX. Possuem práticas surpreendentes de autoflagelação e sadismo.

Entre os sero-Dahlam, há indivíduos do sexo feminino e do masculino, jovens e idosos, embora essa última faixa etária seja encontrada com mais dificuldade. Eles se reúnem com frequência variada em templos espalhados pelas cidades. As metrópolos possuem vários, enquanto as cidades pequenas nem tantos, mas é incrível a proliferação desses santuários da dor nas últimas décadas.

Alguns membros vão sozinhos, outros em bando. Dentro dos templos, uma infinidade de máquinas e acessórios que auxiliam o autoflagelo. Há alguns Dahlam pertencentes a uma casta superior. São eles quem enumeram as lições de tortura e vigiam os membros. Se o praticante não estiver cumprindo a lição a rigor, eles gritam, provocam, intimidam ou seduzem a fim de que o indivíduo finalize todo o ritual.

Existem dezenas de tipos diferentes de rituais. Em um deles, as mulheres Dahlam amarram receptáculos de areia nos braços e pernas. Algumas realizam danças específicas, frenéticas, com os recipientes presos ao corpo; outras erguem blocos de chumbo até a exaustão total. Às vezes, em uma espécie de castigo consentido, elas oferecem ajuda entre si para que os receptáculos sejam encaixados com exatidão.

Há diversas máquinas no interior dos santuários Dahlam. Algumas contorcem o corpo, outras servem de apoio para os blocos de chumbo. Há máquinas específicas para ferir braços, pernas, tórax, costas. A maioria dos Dahlam só deixa o templo ao sofrer lesões pelo corpo inteiro. A dor não é o limite: mesmo abatendo-se com os rituais, eles retornam dia após dia para se agredir e ver os outros se agredirem. A excentricidade dos rituais de corpo dos sero-Dahlam assemelha-se à da tribo Nacirema, estudada por Horace Minner.

Alguns pesquisadores creem que os sero-Dahlam obtêm prazer com os rituais sádicos, uma vez que os indivíduos não comparecem aos templos por coerção. Em seis meses de observação, notei que os rituais fazem com que os corpos dos Dahlam se deformem com o passar do tempo; em alguns casos, ficam horripilantes de tão inchados. Contraditoriamente, eles se vangloriam da deformidade. Quanto mais o corpo for avolumado ou dilatado, mais atração exercem no indivíduo do sexo oposto.